quarta-feira, 5 de agosto de 2015

O caçula

Ian. Três letras. Simples. Na essência.
Teu nome significa "Deus é gracioso", mas não foi por isso que o escolhemos. Teu pai e eu pensamos em deus de forma bem diferente da maioria das pessoas, como vais notar. Na verdade, foi teu pai quem escolheu teu nome. Acho que ele já te esperava antes de sabermos que ias chegar. A gente te conta mais tarde sobre essa escolha.
Pra mim, tu representas o inesperado da vida. De forma concreta, você é energia materializada. Tivemos um início turbulento, eu sei. Sou uma mulher de extremos. Por vezes racional demais, por outras, passional, sentindo tudo demasiadamente. E há quem diga que sou leve!
Querido, por essa relação intensa e sem controle (de minha parte), percebo como já sou ligada a você. Viemos ao mundo da mesma forma: surpreendendo, causando, mobilizando. Somos caçulas, nos entendemos. Te percebia quieto, como que sondando quem se aproximava. As vezes te sentia descontraído e me alegrava com tua dança em mim.
Acima de tudo, já sou louca por ti. Despertas em mim humanidade. Te esperei com ânsia de conhecer melhor aquele que tanto já me modificou.

Chegou na hora certa!

PS: Felizmente teu pai e eu somos jovens e descuidados.

Tua mãe.
3.8.15

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Até quando, hein?

Olhe, se tem acontecimento que me faz mais reflexiva, crítica e intolerante, este se chama gravidez!
Quem me conhece sabe que não curto essa fase. Não acho nada graciosa, pelo contrário. Acho que ficamos desengonçadas pra caramba e o pior, perdemos a autoridade sobre nossos corpos e nossas vontades. Isso mexe demais comigo. Mas venho hoje, depois de pensar um bocado no caso, falar de algo específico. Me encontro aos 27 anos, terei meu segundo filho, sendo esta minha terceira gestação e diante do processo subjetivo punk em que entro toda vez, decido que não quero mais ter filhos. Entro em contato com minha médica e ela quem decide: "Não faço laqueadura em você. Você é jovem e só tem dois."
Ora, eu quem deveria pensar sobre isso, não? Mas meu marido pode. Ele pode decidir sobre sua vontade de ter mais filhos ou não aos 29, pode fazer vasectomia e ela pode ser reversível sem causar alterações hormonais pro resto da vida dele. Me pergunto se estas diferenças seriam apenas orgânicas ou mais uma vez impostas por um sistema onde o patriarcado prevalece.

Juro que esta não será uma das discussões vagas sobre feminismo que vejo na internet. Só quero com isso mostrar o quanto estamos distantes de sermos livres para tomarmos decisões sérias acerca de nossas vidas, de nosso futuro. Conseguimos muito, eu sei. E isso deve ser relembrado e celebrado sim. Mas busquemos mais! Que a gente consiga que não mais o Estado decida sobre nossos sagrados corpos, que a luta se faça para além de nossa liberdade sexual já almejada (viva!). Eu quero mais. Quero que minhas amigas "feministas" não pensem que feminismo é ir trabalhar fora, like a man, mas de batom e salto alto. Não quero que se posicionem contra outras mulheres por causa da roupa de "piriguete". Quero que nos unamos e entendamos de vez que feminismo não se trata de superioridade sobre os homens ou outras mulheres, mas sim sobre equidade! Justiça e imparcialidade! Respeito às escolhas tomadas por toda e qualquer mulher. Afinal, foi por isso que tanto já se lutou.
Quero poder decidir de forma tranquila, sem polêmica e com consciência sobre o meu corpo. Li um depoimento de Marta Suplicy sobre ser mãe de seus dois filhos e concordo com ela quando ela diz que meninos devem ser educados e criados também pelos seus pais, pois enquanto a maternagem for tratado como sendo uma "habilidade feminina", mais distantes estaremos da redução dessa diferença de direitos entre homens e mulheres.
Vai ver por isso o Universo me mandou dois homens! Meu desafio será torná-los livres em suas escolhas e que achem natural que a mesma liberdade seja prerrogativa de mulheres e homens de sua época. Aceito o desafio! ;)

terça-feira, 2 de junho de 2015


Tom,

Há um bom tempo tenho tentado te escrever algo diante das sensações e reflexões que tenho tido desde que você nasceu um ano atrás. Mas não consigo. Não consigo porque, com sua chegada, foi-se embora minha eloquência, minha coerência. Busquei-as por um tempo, me angustiei por não tê-las achado, me estranhei e depois compreendi o motivo de ter perdido esse tanto. Porque finalmente saí do ego. Graças a você. Achei que conseguiria isso com meditação, mas nem!

Você quem faz minhas palavras saírem hoje diretamente do coração. Você quem me ensina a ter uma vida mais à toa. Sim, eu dentro do meu machismo velado, antes de você, achava que "só" te cuidar era tarefa pequena. Achava que cuidar de nossa casa era pouco, diante do que me era cobrado socialmente. Eu antes tão sabida, sensata e resolvida, descubro um universo onde o tédio não tem vez, onde a coerência faz-se desnecessária. O que pude fazer? Me render ao que você me trouxe e me trará. Me render à vida sem datas ou relógios, ao seu tempo e não ao meu, ao cuidado destinado ao nosso lar feito com prazer, porque lá é uma delícia de explorar e porque é onde quero estar até quando der. Só isso. Sem espera, nem ansiedades.

Maternar você, e agora seu irmão, sem dúvida foi a abertura pra uma Rebecca nova, que se buscou muito em livros e títulos e rótulos, mas que agora faz tudo isso por puro prazer em partilhar, principalmente com vocês que são minha missão. Essa aqui é grata por perceber que tua chegada a transformou.

Um ano. Não teremos festão. Teremos outras vivências pra te incluir com intensidade. Temos a certeza em nosso coração que estaremos soltando no mundo homens de bem, com prazer e confiança no que há dentro de cada um, no tempo certo.

Enquanto isso, fica aqui colado com mainha, por favor! Feliz vida, pinguinho!

Que amor tão grande!

Tua mãe.

R.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Lembranças que um bebê não terá

"Lembro do dia em que eu completei cinco meses de vida. Costumávamos ficar, minha mãe e eu, muito tempo sozinhos em casa. Meu pai sempre chegava à noite.
De manhã, quando eu acordava, minha mãe me recebia com muitos "bom dia", muitos beijos e cheirava minha boca afirmando que era o "melhor bafo que havia". Nesse dia não foi diferente.

Enquanto ela arrumava a casa, tocava Pink Floyd na TV. Sempre tocava algo na TV. Acho que eu gostava. Nossa casa sempre cheirava a canela ou sândalo, não sei. Tudo foi normal naquele dia. Eu ficava no carrinho, na entrada da cozinha, enquanto minha mãe lavava a louça, fazia seu café servido direto na caneca vermelha. E eu observava tudo com o som ao fundo. Eu ria do jeito dela. Ela não parava! Terminava uma coisa, já ia fazendo outra!

Veio a hora do banho, depois hidratante, depois massagem com um oleozinho lá...eu curtia aquilo. Soneca? Eu e ela. Hora da fruta? Eu e ela. Friends na TV? Eu e ela. As leituras dela? Eu acompanhava.

A noite era do meu pai. Quando ele chegava a diversão era certa! Risada, cócegas, turbulência...tudo muito bom! De madrugada, meu pai sempre vinha conferir se eu tava respirando ou vinha colocar de volta minha chupeta caída, enquanto eu chorava. Ele sempre preparava minha mamadeira, mas nunca me dava porque achava que não levava "jeito".

Lembro dos dois sempre e beijarem e se abraçarem perto de mim. Como se quisessem me passar algo. Talvez o amor que sentiam um pelo outro e por mim. Acho que captei a mensagem, lembrando agora dos rostos dos dois próximos do meu.

E naquele dia, tudo foi fatidicamente igual. E mágico."

PS: Para Tom, nos seus 5 meses de vida. Em três de novembro de dois mil e catorze.

terça-feira, 27 de maio de 2014

Carta ao Tom

27 de maio de 2014

Tom,

Faltam seis dias pra te ter conosco. Ando muito ansiosa. Sei que quando estiveres aqui não terei palavras pra descrever o momento, então quero aproveitar esse sentimento de agora. Vou começar pela escolha de seu nome. Digo às pessoas que queria um nome curto e significativo. E só. Não curti me explicar diante da polêmica causada pela escolha de seu nome.
Sua mãe é bem polêmica, se acostume. Mas na verdade, pra mim, tem um sentido enorme, expansivo. Um tom a mais, uma mudança, uma nova cor, nova melodia. Foi isso que minha vida ganhou quando ouvi pela primeira vez seus batimentos cardíacos. Não podia ser diferente. Não podia escolher outro nome.

Não espere escolhas comuns vindas de seu pai e eu. E nós esperamos que você curta essa irreverência. O mundo é legal e pode ser bem melhor se dermos uma pequena ajuda pra isso. Como por exemplo, se escolhermos amigos leais, artes variadas, músicas que inspirem, momentos que acrescentem, literatura, gargalhadas, etc. Serás desse mundo, não apenas meu e de seu pai. Terás muito que explorar. Prefira ser do bem, mas não um conformista. Nem tudo são flores, mas nem ligue. A vivência de uma vida interessante vale mais que a “certezas” por aqui impostas. Não precisa “ser teso”.

Não sei quais são as escolhas certas. Não poderei te ajudar nisso. Posso te ajudar a ter coragem de viver. Posso recuar quando sentir insegurança, mas se perceber que é o que quer, te incentivo.
Posso querer mil coisas pra ti. Elas não interessam muito agora. Pois o que quero mais é te ver livre, aberto, sorrindo, valorizando o essencial, abraçando, argumentando...chega!

Veremos com o que vais chegar de teu. Meu filho, desde já, seja bem-vindo.
Já és imensamente amado por tantos.

Nos vemos em breve.




terça-feira, 11 de março de 2014

A casa da minha mãe

Passei um mês na casa da minha mãe, pois quebrei o pé direito em plena gestação de seis meses.
Motivos divinas? Sabe-se lá.
Sei que foi um período de muita observação e reflexão.
Entre as váaaarias coisas que vivi em pensamento, uma delas foi o próprio ambiente em que estava.
Ei-lo:
A casa da minha mãe tem vida em todos os cômodos da casa.
Tem gente o tempo todo. Visitas legais e abusadas demais. Comida pra todo mundo e café várias horas no dia. Tem som ligado em lugares diferentes. Tem cachorro, gata que dá cria e passarinho cantador.
Tem crianças, brinquedos espalhados e música de bebê.
Tem roseira, coqueiro e bananeira. Pé de acerola, de mamão e outras frutas.
Tem suco delas misturadas e muito amor no seu preparo.
Tem briga de irmãos, encrenca de marido e mulher depois de tanto tempo de convivência.
Um e outro que dá pitaco, sempre querendo o bem, às vezes querendo demais da conta e esquecendo de ajudar. Não é fácil, mas isso é vida.
Depois o sentimento fala mais alto e vem o pedido de desculpa e o "te amo" volta a aparecer no final da ligação.
As peculiaridades que nos compõem formam o magnetismo presente na casa da minha mãe. Chega lá pra tu ver. Não tem quem não goste. Tudo do jeito que o deus dela quer.

Na verdade é a casa dos meus pais. Mas pai, desculpe, quem dá o charme e a energia vital é mãe.

                                 

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Sobre os meus amigos

Os meus amigos são os melhores.
Tenho amigos feitos 20 anos atrás, 15 anos atrás, 8 anos atrás, poucos anos atrás.
São poucos os meus amigos, mas muito singulares.
As minhas amigas não discutem sapatos ou marcas de roupas ou última moda, não ligam pra isso. As minhas amigas preferem tomar cerveja e dar risada. Os meus amigos não usam Instagram ou Facebook pra dizer que estão comigo, eles fazem essa questão offline. Não precisamos de lembretes de aniversário pra lembrar um do outro nos seus respectivos dias comemorados há anos a fio.
Não nos expomos, somos discretos em nossos prazeres. E não por chatice, mas simplesmente por falta de interesse nesse mundo tão fútil como anda.
Não sabemos o que andam discutindo os mais cults. A gente se entedia.
Não temos rótulos, preferimos pista a camarote, fumamos em boates só porque a achamos chata, preferimos boteco, tripa, cerveja gelada, barata e gente com cuca legal.
Não queremos muito da vida. Um drinque tá bom. E um prato de galinha guisada.
Tenho amiga irmã, amigo amante, amigas de infância, de faculdade, de birita, de B.Os., para todo o sempre, assim seja.
Não queremos fazer novos amigos, não somos bons nisso, eu percebo. Queremos apenas que o amor permaneça. E a gente permaneça. Jovens de alma, velhos amigos.

Obrigada a todos esses lunáticos que combinam comigo. Amo tanto vocês.